sábado, 18 de fevereiro de 2012

A luz da madrugada

Com os olhos ainda fechados, percorri a cama com as mãos na tentativa de te encontrar para me confortares. Quando fechei as palmas e encontrei apenas o vazio do teu lado da cama, procurei-te pelo quarto escuro. Não estavas. Pensei em não me preocupar e simplesmente virar-me e continuar no planeta dos sonhos. Mas não consegui, estava sozinha e fazias-me falta.
Corri o quarto escuro com o olhar, mas mais uma vez, não te encontrei. Já preocupada, senti a necessidade de me levantar, abrir a porta e procurar-te pela casa. A luz do luar estalava-se-me nos olhos, cegando-me momentaneamente. O caminho até à sala era cheio de altos e baixos, tinhas livros e mais livros e umas coisinhas insignificantes espalhadas por todo o lado. Começou a cheirar a tabaco e um fumo espesso já entrava pela cozinha dentro. Um perfume demasiado forte para ser apreciado a esta hora da madrugada. Agora já sabia o que estavas a fazer e apetecia-me voltar para a cama. Ainda assim, queria ver. Estava a fazer o caminho ao contrário e detive-me. Fui à sala. Encostei-me à ombreira da porta e lá estavas tu. Era tão bonito apreciar-te. Sempre adorei apreciar-te. Quem me dera que fosses sempre assim. Tão dedicado, tinhas-lhes uma paixão tão grande. Lá estavas tu, como em noites passadas. A luz que entrava naquele 3º andar tinha uma cor agradável, quase convidativa. Era de um vermelho escuro brilhante. Lá estavas tu. Passavas uma mão no cabelo e com a outra, seguravas um cigarro com a cinza por bater. Imerso no que estavas a fazer, nem paraste para pensar de quem seriam os passos de quem se aproximava. Lá estavas tu. Com o livro pousado no colo e as pernas empoleiradas em cima do varandim, lias histórias de pessoas inquietas com uma paz de alma que raramente é tua característica. Lá estavas tu. A luz era realmente agradável, principalmente quando acertava mesmo no teu tronco nu. Já havias batido o cigarro e a cinza jazia agora dentro de um pequeno cinzeiro de metal que te ofereci para situações como esta. Como era perfeita aquela visão de ti a leres, tão sereno, que quase me esquecia que tens defeitos. O vidro da janela estava aberto porque fazia calor naquele minúsculo apartamento que era todo muito teu. Passou uma brisa gelada, tão fria que te fez arrepiar. Mas ainda assim, lá estavas tu. Não paravas para pensar, para olhar, não paravas para mais nada sem ser para ler. Não queria quebrar aquele momento. Queria tanto congelar esta tua imagem na minha cabeça, que não queria sequer mexer-me para que tu me notasses. Pé ante pé, voltei para o quarto, e ao pensar na luz vermelha que entrava pela janela e no teu livro de colo, só desejei ter o privilégio de ser para sempre tua, nunca ser de outro alguém. Nunca me deixes pelos livros. Deixa-me estar aqui dentro da tua cama, da tua casa, da tua rua. Deixa-me estar perto de ti e dos teus pensamentos. Eu, tu e os livros. Pode ser? Diz que sim, por favor, diz que sim. 

Sem comentários:

Enviar um comentário