domingo, 4 de dezembro de 2011

As palavras certas pela boca errada

O Secretário de Estado da Juventude e do Desporto, Alexandre Miguel Mestre disse num qualquer sábado passado que os jovens portugueses deviam emigrar, sair da sua "zona de conforto". No fundo, o discurso é verdadeiro e assenta em factos reais, para além de ser incrivelmente actual. Existe só um pequeno aparte: saiu pela boca errada. 
Supõe-se que Alexandre Miguel Mestre já tem dedos de testa suficientes para saber que é impensável fazer uma afirmação pública daquele teor. Hoje em dia fala-se em troika, em austeridade, em crise económica, em instabilidade da União Europeia e todas as outras desgraças com que tantas vezes somos presenteados no telejornal. Ainda dentro do tema da crise, mas para que o assunto não cansasse os portugueses, o responsável da Juventude e do Desporto decidiu que o seu discurso deveria incidir precisamente na Juventude (e não tanto no desporto, pelos vistos). 
A verdade é que os jovens portugueses (e falo por mim também) enfrentam graves problemas quando chega a altura de arranjar um emprego e isto está presente em várias situações. Muitos dos sistemas universidade-1ºemprego não estão minimamente bem estruturados e os cursos de ciências sociais e humanas são, no geral, um bom exemplo disso. Para se adquirir a carteira de jornalista, é necessário fazer 12 meses de estágio curricular (que se pressupõe ser feito no final da licenciatura), mas as coisas não se processam exactamente dessa forma.
Primeiro, porque uma das coisas mais difíceis hoje em dia é arranjar um estágio (remunerado ou não), porque as redacções, cadeias de televisão e estações de rádio já estão atafulhadas de gente. Mas este não é o ponto fulcral do meu comentário. O meu comentário incide especialmente sobre casos em que a licenciatura não foi de Ciências da Comunicação ou de Comunicação Social. Tirei Línguas, Literaturas e Culturas e estou a fazer o mestrado de Jornalismo. Supõem-se então que também terei um estágio obrigatório de 12 meses, mas na verdade, preciso de um de 18 meses para estar apta a ter carteira de jornalista. O ponto essencial é este: quem, no seu perfeito juízo, vai colocar uma jovem aspirante a jornalista sem um curso ligado à área, a estagiar? Ninguém. E esse é precisamente um dos problemas hoje em dia, determinadas regras, burocracias e passos a seguir que não fazem sentido e na minha opinião, precisam de uma reestruturação para funcionarem a 100%.
Em Portugal, ou se é o melhor finalista do curso X ou Y, ou se conhece o presidente de um qualquer tipo de órgão ou associação importantes. Realmente é verdade o que o Sr. Secretário disse, concordo plenamente. Mas aí está a diferença. Eu não faço parte de um governo que gere um país em crise. Eu faço parte de uma geração pouco apreciada. Lá fora as coisas funcionam de outra maneira. Aliás, basta que funcionem para se notar a diferença. Este país não deixa que os mais novos dêem ideias e principalmente, que sejam pro-activos. Lá fora toma-se atenção a ideias pioneiras, a projectos ambiciosos e a novas políticas de trabalho e de investigação. Cá dentro faz-se o que se pode e o que se pode fazer hoje em dia não chega para essas pessoas ambiciosas e com bons projectos para apresentar. Por isso sim, concordo. Vamos para fora deixar que nos ajudem a tornar as nossas ideias realidade. Isto sou eu que digo, mas não aconselho que o Sr. Secretário de estado da Juventude e do Desporto volte a mencionar esse assunto, porque será a morte do artista.
Uma coisa sou eu, que posso passar bem por jovem desempregada revoltada, outra coisa são eles, que têm o dever de tentar não agravar a situação.

1 comentário:

  1. Li o teu texto e tocou-me.

    Compreendo-te perfeitamente. Também fiz um percurso parecido, tendo começado pela Tradução e estando agora nas Ciências da Comunicação. Em geral o mercado para as pessoas ligadas à ciências sociais está gasto mas não quer dizer que não continuemos a lutar.

    Imagino que para os jornalistas seja ainda mais difícil pelo 'handicap' da carteira que serve como um passaporte de credibilidade profissional como tu descreveste. E mesmo para quem já a tem também deve haver uma forte competição.

    Em relação ao estágio, não te preocupes. Mesmo que não tenhas licenciatura em jornalismo, podem aceitar-te em redacções se explicares que precisas da experiência como complemento para o mestrado, o que é verdade. Eu pude fazê-lo, se bem que numa área paralela.

    Há que ter fé e não desistir. Ânimo :)

    André Carvalho

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