quarta-feira, 7 de dezembro de 2011

Saramago não é o fim

Não pude deixar de reparar que fui ligeiramente 'categórica' quando disse que em Portugal não se faz quase nada bem feito. É mentira. Aliás, não é, mas não posso deixar de pensar que posso ser mal interpretada ao dizê-lo, porque na verdade, todos os dias vejo bons projectos a serem pensados, delineados e a serem quase levados para a frente, para passarem da teoria à prática, mas isso depois acaba por não acontecer. 
Acaba por não acontecer porque o governo não tem dinheiro porque está em crise e por consequência, as organizações privadas que costumam financiar projectos do género, também não o fazem porque 'estamos em crise'. Não tendo nada a ver com isto, não posso deixar de dizer que acho que existe uma área em Portugal que está a evoluir brutalmente - tanto em qualidade, como em quantidade. A literatura. Nomes como Valter Hugo-Mãe, Rentes de Carvalho, Pedro Peixoto ou Pedro Paixão inserem-se em géneros completamente diferentes e muitas vezes mesmo antagónicos, mas na minha opinião, não deixam de ser todos autores sublimes, por razões diversas. Rentes de Carvalho é um dos escritores emigrantes portugueses que melhor descreve Portugal a partir de uma vertente muito pouco discutida: o interior do país. De Valter Hugo-Mãe, que não se espere uma literatura light porque não o é. Não me considero no direito de 'catalogar' os escritores que mencionei, só de delinear a minha opinião sobre os mesmo e filosofar sobre as vertentes que acho mais interessantes em cada um. Recentemente, li 'Sinais de Fogo', de Jorge de Sena e ainda hoje, não acredito que tenha sido escrito na altura em que foi, dentro do contexto social e político em que foi. O autor fala da guerra civil de Espanha, de sexo com amor, de sexo sem amor, de pensamentos próprios de um adolescente incompreendido por adultos demasiado velhos, de Coimbra ter quase a mesma importância que a capital Lisboa, do significado de 'estudar fora' ser sempre dentro. 
Fala-nos de uma forma tão humana e tão literária ao mesmo tempo, que é difícil não nos colocarmos ao lado do narrador e não pensarmos "eu também falo assim de vez em quando". Concordo com a teoria de que não fica bem colocar palavrões em obras literárias, mas Jorge de Sena consegue escrevê-los de uma forma tão utilitária, que perde o sentido feio e nojento que é de costume incutirmos. Em suma, consegue fazer com que os jovens se identifiquem e os mais leitores mais velhos retrocedam no tempo e se apercebam que ser adolescente não pode ser esquecido e mantido na penumbra de um passado distante.
Dantes não gostava de literatura portuguesa. Tinha um preconceito estúpido que ainda estou para saber onde nasceu - começo a desconfiar que foi no secundário, quando me apresentaram grandes autores e obras portugueses com uma falta de entusiasmo gritante. Achava que tudo o que era escrito em português tinha de ser escrito daquela certa maneira e com aquele estilo específico, até que abri os meus horizontes e me apercebi que a literatura portuguesa não acabou em Saramago ou Sttau Monteiro. A literatura portuguesa continua e muito bem, continua a avançar e se as organizações e o governo quiserem, de vento em popa. E se a crise também ajudar, claro.

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